Aqui estarão registrados textos poéticos, ou não, selecionados por mim e pela simpatia, carinho de amigos. Alguns serão um atrevimento meu, tambores a ressoar neste espaço. E, se quiserem acusar alguém , acusem-me, por favor!
domingo, 25 de julho de 2010
PERGUNTA, Cecília Meireles.
Estes meus tristes pensamentos
Vieram de estrelas desfolhadas
Pela boca brusca dos ventos?
Nasceram das encruzilhadas,
Onde os espíritos defuntos
Põem no presente horas passadas?
Originaram-se de assuntos
Pelo raciocínio dispersos,
E depois na saudade juntos?
Subiram de mundos submersos
Em mares, túmulos ou almas,
Em música, em mármore, em versos?
Caíram das noites calmas,
Dos caminhos dos luares lisos,
Em que o sono abre mansas palmas?
Provêm de fatos indecisos,
Acontecidos entre brumas,
Na era de extintos paraísos?
Ou de algum cenário de espumas,
Onde as almas deslizam frias,
Sem aspirações mais nenhumas?
Ou de ardentes e inúteis dias,
Com figuras alucinadas
Por desejos e covardias?
Foram as estátuas paradas
Em roda da água do jardim…?
Foram as luzes apagadas?
Ou serão feitos só de mim,
Estes meus tristes pensamentos
Que boiam como peixes lentos
Num rio de tédio sem fim?
quarta-feira, 14 de julho de 2010
MULHER AO ESPELHO,Cecília Meireles
Mulher ao Espelho
Hoje, que seja esta ou aquela,
pouco me importa.
Quero apenas parecer bela,
pois, seja qual for, estou morta.
Já fui loura, já fui morena,
já fui Margarida e Beatriz,
Já fui Maria e Madalena.
Só não pude ser como quis.
Que mal fez, essa cor fingida
do meu cabelo, e do meu rosto,
se é tudo tinta: o mundo, a vida,
o contentamento, o desgosto?
Por fora, serei como queira,
a moda, que vai me matando.
Que me levem pele e caveira
ao nada, não me importa quando.
Mas quem viu, tão dilacerados,
olhos, braços e sonhos seus,
e morreu pelos seus pecados,
falará com Deus.
Falará, coberta de luzes,
do alto penteado ao rubro artelho.
Porque uns expiram sobre cruzes,
outros, buscando-se no espelho.
domingo, 11 de julho de 2010
Poesia de Shakespeare
Soneto 23 ~
Como no palco o ator que é imperfeito
Faz mal o seu papel só por temor,
Ou quem, por ter repleto de ódio o peito
Vê o coração quebrar-se num tremor,
Em mim, por timidez, fica omitido
O rito mais solene da paixão;
E o meu amor eu vejo enfraquecido,
Vergado pela própria dimensão.
Seja meu livro então minha eloqüência,
Arauto mudo do que diz meu peito,
Que implora amor e busca recompensa
Mais que a língua que mais o tenha feito.
Saiba ler o que escreve o amor calado:
Ouvir com os olhos é do amor o fado.
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