De profundis
Senhor, que sabes quem sou,
Sabe lá também o resto:
Sabe lá que o meu protesto
Não é isto que tu vês...
Não é isto...
Nem a facada do teu filho Cristo...
Nem o pranto que tens visto
Correr em lava a teus pés...
Não é isto,
Nem o sonho de Babel...
Nem o bombo que fiz da minha pele...
Nem o Credo num Deus que me perdeu...
Foram gestos que passaram
Pelo meu corpo e roubaram
Um perfume que julgaram
Que era meu...
Não é isto, nem aquilo
Que um mocho a cantar de grilo
Te mandou como um sinal
Da grande dor que me dói...
Só é sinal do meu todo
Esta elegia do lodo,
Que não foi...
Não é isto,
Nem o muito que há-de vir:
O sarro que há-de sair
Da vasante da maré...
O fundo do mar é sujo,
Mas nos olhos do marujo
Não se vê...
Não é isto, nem é nada
Que chegue à tua morada
Se, a minha assinatura,
Que sou eu...
Eu, esta ovelha ranhosa
Que remói silenciosa
a lembrança dolorosa
do pastor que lhe bateu...
O Outro livro de Job (1936)
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